Sobre continuar

Fechei os olhos pronta para imergir na escuridão sem pensar em nada, mas Caetano, como sempre, me fez vacilar cantando: “agora, que faço eu da vida sem você?”. Não soube responder. Ele insistiu: “e te querendo eu vou tentando te encontrar (…) Buscando em outros braços seus abraços”. Alguns segundos depois eu pude sentir o calor das lágrimas desenhando caminhos em minhas bochechas. Não tinha mais volta. E dessa vez era Maria Gadú me dizendo: “te amei mais que a mim, bem mais que a mim”. E amei. Amo. Amarei. Sempre muito mais que a mim.

Passei a maior parte do tempo tentando me ocupar, sem deixar espaço nem tempo para a mente começar a me relembrar. Mas, não adianta, não é? A dor, mais cedo ou mais tarde, vem. Chega forte, sem aviso prévio, sem pedir licença e avança. Avança sem ponderar. Te toma de assalto, atropela. Eu achei que com o tempo eu fosse me acostumar, ou pelo menos enfrentar isso de um jeito melhor. De certa forma, agora está sendo mesmo mais fácil de lidar, mas tudo isso é porque eu ando evitando. Evito lembrar, evito ficar no meu quarto e encarar seu sorriso nas várias fotos espalhadas pelas paredes. Evito andar pelos lugares que costumávamos andar juntas, porque eu não aguentaria ver minhas pegadas desacompanhadas das suas. Eu evito pensar, até mesmo, que tudo o que aconteceu realmente foi fato. Estupidez, talvez, eu sei. Mas eu finjo, finjo que você está viajando, que essa é apenas mais uma daquelas épocas difíceis da gente se falar.

Chega a ser ridículo tudo isso. Não adianta eu fingir, tentar maquiar. A verdade nunca vai deixar de ser o que é por detrás de tudo. E aí eu me olho no espelho vestida com a minha armadura mais forte, achando que consigo. E admito, admito que eu nunca mais vou ter você de volta na minha vida. Admito que não importa o que eu faça, tudo agora são lembranças, que eu preciso seguir em frente, que você está num lugar melhor, que Deus sabe o que faz. Baboseira! A verdade é que eu faço isso pra ver se eu consigo acreditar nisso tudo. Pra ver se eu consigo parar de culpar a vida por ter tirado de mim uma das coisas que jamais poderiam ter sido arrancadas. Para ver se eu consigo conviver com isso.

Às vezes fico com uma culpa idiota no peito. Culpa de estar vivendo coisas que eu gostaria que você estivesse aqui acompanhando. Culpa por achar que eu devia ter te deixado mais vezes tímida ao dizer que te amava. Culpa por ter ficado um tempo sem procurar notícias suas e você partir sem poder me contar teus últimos sentimentos. Mas aí toda essa culpa se transforma em uma saudade imensa dos nossos longos bate-papos. Se transforma na dura realidade de que eu já não posso mais pegar o telefone e te ligar angustiada, só para ouvir você dizer que vai ficar tudo bem. Vai ficar tudo bem?

Eu continuo olhando para o céu e rezando para que você, de alguma forma, possa me ouvir. Eu continuo lembrando de você toda vez que alguém elogia a tatuagem que fiz em sua homenagem. Eu continuo tentando imaginar onde é que você está, assim como eu continuo seguindo, só para fingir que a sua falta não me dói tanto.

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